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Stranger Things, American Horror Story e a falta de coragem da indústria do entretenimento

Foto do escritor: Maicon EpifânioMaicon Epifânio


Pôster promocional do Volume 2 da série Stranger Things

 


É um fato que a série Stranger Things é um grande fenômeno desde sua estreia, maior ainda com o lançamento da quarta temporada. Segundo matéria do site Mundo Conectado, por Juliano Aires, a nova temporada ultrapassou 1 bilhão de minutos assistidos com o Volume 2 na Netflix. O Volume 2 é referente aos dois últimos episódios da temporada, lançados na última sexta-feira (01/07). Segundo a mesma publicação, a quinta temporada já está confirmada e começará a ser escrita em agosto. A matéria diz que ainda não há uma data de lançamento, mas estima algum momento a partir de 2024.

Quando terminei de assistir à segunda parte da temporada, me senti tomado por percepções conflitantes. Busco sempre consumir produções culturais com um senso crítico, mas o meu lado fã estava empolgado com todo o impacto que o Volume 1 me causou. O personagem Vecna, vilão introduzido nesta temporada e com fortes referências ao clássico assassino sobrenatural Freddy Krueger de “A Hora do Pesadelo” (1984), me cativou ao dar uma camada a mais de horror à série. Porém, os dois episódios lançados recentemente deram vida ao meu medo: a covardia da equipe criativa de Stranger Things.




Respectivamente, da esquerda para a direita, os vilões Freddy Krueger e Vecna


Não é de hoje que, embora quase sempre elogiada, a série é apontada por criadores de conteúdo como uma obra covarde no que diz respeito ao destino dos seus personagens. Em muitos momentos das temporadas anteriores, Stranger Things introduziu personagens novos cativantes para matá-los enquanto os protagonistas escapavam quase ilesos dos perigos que enfrentavam. No Volume 2, infelizmente, não foi diferente, mas o que causou maior decepção foi o burburinho, incentivado pelos próprios criadores, que prometeu que o desfecho da temporada seria mais pesado. Segundo uma publicação da UOL, por Paloma Xavier, “os Duffer Brothers, criadores da série, revelaram em entrevista à ‘Variety’ que ‘com certeza’ haverá uma contagem de corpos no último episódio”. Outros veículos e criadores de conteúdo reproduziram essa informação que, na realidade, não foi como o esperado.

Por outro lado, recentemente também assisti à terceira temporada da série antológica American Horror Story. Nomeada como “Coven”, ela estreou em 9 de outubro de 2013, nos Estados Unidos, para a emissora FX. Seu enredo focou em uma instituição para jovens bruxas em New Orleans e trouxe um tom bem distinto das duas primeiras temporadas, as únicas que eu tinha assistido até então. E talvez você se pergunte: o que essas duas séries tão distintas, lançadas em momentos tão diferentes, têm em comum? Talvez, pouca coisa, mas o ponto é o que as duas não têm em comum. Quando assisti aos novos episódios de Stranger Things, senti pouca veracidade nas ameaças vividas pelos personagens. Obviamente, vivi outras sensações, principalmente no que diz respeito à emotividade das cenas, mas não acreditei que os mocinhos estavam ameaçados pelo roteiro de maneira legítima. Por sua vez, American Horror Story demonstrou mais de uma vez a capacidade de nos surpreender e de evidenciar que ninguém está realmente seguro.





American Horror Story é uma série de horror antológica; sendo assim, as tramas de suas 10 temporadas são independentes entre si, com algumas exceções


Você pode pensar que a comparação é injusta, uma vez que cada temporada de American Horror Story possui certa independência das demais e que todos os personagens são descartáveis. Além disso, é claro, a obra costuma contar com recursos de “resgate” de personagens que morrem, diferente de Stranger Things. Por outro lado, a antologia de horror consegue nos cativar com atuações convincentes e um roteiro que explora cada camada dos elementos que apresenta. Mesmo conhecendo a natureza da série e já me preparando para desfechos trágicos para alguns personagens, muitas das mortes apresentadas em “Coven” me impactaram. Com somente 13 episódios, a história conseguiu me gerar um temor real pelos meus favoritos, algo que Stranger Things continua fracassando mesmo após tantas temporadas de uma trama contínua. Cada capítulo me gerava a sensação genuína de que tudo poderia acontecer.

A covardia típica dos criadores de Stranger Things, infelizmente, não é exclusiva da mesma. Diversos outros produtos culturais geram situações pouco críveis, estabelecem personagens como bodes expiatórios e criam resoluções mirabolantes para manter os seus “intocáveis” a salvo. Nenhuma obra precisa eliminar todos os seus mocinhos ou vilões sem nenhum pudor como se apenas violência gerasse impacto no público, mas não devemos parar para pensar sobre o que acovarda as mentes criativas por trás de produtos tão fantásticos? Chega a ser hipócrita quando, em seu último episódio, a série dos Duffer Brothers mata o personagem Eddie (interpretado por Joseph Quinn) fazendo uso de um discurso de coragem do mesmo. Onde está a coragem em matar uma figura nova na série e salvar constantemente os “mocinhos clássicos” com óbvias facilitações de roteiro?




Eddie Munson (Joseph Quinn) em cena do último episódio da quarta temporada de Stranger Things


Acredito que séries, filmes, quadrinhos e outros produtos precisam assumir a coragem que eventualmente dizem promover, assim como devem cumprir com aquilo que prometem para seu público. Na vida real, não existe um roteiro para nos salvar de tudo e precisamos aprender a lidar com perdas e fracassos. A sensação que fica para mim é que a indústria do entretenimento tem receio de assumir decisões fortes e opta por sacrificar a lógica e até mesmo a qualidade das produções. Certos temas se esvaziam e pautas importantes deixam de ter tanto impacto porque parece ser mais relevante proteger as “pedras preciosas” de uma história. Um produto midiático, ao mover mundos e fundos para salvar um queridinho do público, em minha percepção, pode estar formando uma audiência infantilizada e imatura que replicará em sociedade os seus apegos excessivos a personagens da ficção.



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