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Magia: Libertada

  • Foto do escritor: Maicon Epifânio
    Maicon Epifânio
  • há 1 dia
  • 6 min de leitura

Sinopse:


Nascida como mutante, mas criada no Limbo, Illyana Rasputin é possuidora de poderes místicos e equilibra suas duas metades todos os dias. Temida por monstros, Magia vive uma nova fase agora que a nação insular de Krakoa, refúgio para mutantes, chegou ao fim. Quando demônios movidos por uma nova ameaça perseguem mutantes ao redor do mundo, Illyana tem de aceitar novos aliados e enfrentar uma jornada que pode ser bem-sucedida ou submetê-la de vez à própria escuridão. Magia será a salvadora do mundo ou a pioneira sombria do reinado demoníaco na Terra?

Magik (2025) #1 a #5


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O que torna uma pessoa alguém ruim? Origens biológicas? Traumas de infância? Valores aprendidos no decorrer dos anos? Escolhas pessoais? Esta trama começa plantando em você essa semente. Afinal de contas, a própria Illyana inicia a narração, abordando a sua experiência de viver no Limbo por anos até se tornar uma super-heroína. O quão diferente ela seria se tivesse vivido outra vida? A dor foi o que lhe transformou em uma agente do bem, na busca de evitar que outros sofressem como ela?

O enredo não necessariamente dá uma resposta definitiva para tudo isso, mas enfatiza o peso de nossas próprias escolhas nesse processo. Independente das outras possibilidades, a mutante escolheu ser Magia, uma heroína. Ela teve esperança e foi isso que lhe permitiu ser mais do que exigiram que fosse. Um lugar horrível como nenhum outro na Terra não foi suficiente para corromper sua índole e torná-la má. A abordagem do roteiro não é surpreendente por se tratar dessa personagem  — e sua origem “infernal” é bastante conhecida  —, mas é acolhedora. É uma mensagem sobre esperança para quem vive um momento ruim, mas quer sonhar com um futuro melhor.


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Por outro lado, não se trata de uma história infantil com uma promessa utópica. Vidas reais quase sempre são assombradas por fantasmas do passado porque isso faz parte da condição humana. Ainda que possamos tomar as rédeas e definir o caminho, nossas escolhas não são o único fator determinante para o destino que alcançaremos. Aqui, mesmo convicta do que deseja, a protagonista é revisitada pelo que deixou para trás da mesma forma que ocorre com vidas reais. É justamente por isso que ser resiliente em meio à escuridão é um grande feito, na ficção e na realidade.

Chamada de “Filha das Trevas” por alguns, a irmã do herói Colossus possui um aspecto fundamental em comum com outras personagens femininas cujas essências são oscilantes entre o bem e o mal. Jean Grey na Marvel, Ravena na DC… O tropo narrativo da mulher superpoderosa lutando contra a sua própria escuridão é comum nos quadrinhos de super-heróis. Esta obra te leva a pensar sobre o caso de Magia: o quanto a Filha das Trevas é algo separado dela e o quanto as duas são o mesmo ser?


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O que torna Illyana diferente nessa esfera em relação a outras personagens é a sua personalidade ácida e a sua postura combativa, se entregando aos confrontos quando a grande maioria costuma se conter demais por medo de perder o controle. Ambos os caminhos são positivos quando bem executados, mas a trajetória que a Marvel deu para Magia ao longo do anos — e que é abordada de maneira profunda neste enredo — torna ela uma personagem com bagagem própria e identidade inconfundível.

No caso da protagonista aqui, “não se conter demais” não se trata de usar suas habilidades de maneira irresponsável, mas de possuir uma divisão mais clara entre a heroína e a “força maligna” nesta personagem. O seu medo de não ser suficiente em seu lado “bom”, além do receio de jamais ser compreendida por alguém por ser como é, transforma Illyana em uma figura com um dilema próprio sem soar como algo “requentado” de outras personagens similares.


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Acima de qualquer outra coisa, a mutante é uma sobrevivente. Ela precisou enfrentar horrores para chegar onde chegou, algo que facilmente a conecta a determinados leitores. O demônio interno de Illyana pode ser visto como um paralelo para condições psíquicas que acompanham boa parte da vida de pessoas como portadores de depressão ou transtornos de personalidade. Esses indivíduos recorrentemente se veem como Magia: cercados de apoiadores, mas quase sempre precisando resolver seus próprios conflitos internos sozinhos.

Essas relações não são mera interpretação da minha parte, mas uma camada relevante desta narrativa. Afinal, o texto constantemente aborda os aspectos mais negativos da mente da protagonista no que se refere às suas emoções. Ela sobreviveu ao Limbo, mas saiu de lá marcada — de modo espiritual e mentalmente também.


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Por outro lado, apesar de ressaltar a personalidade altiva e independente da heroína principal da trama, o texto também destaca o impacto da confiança — ou ausência dela — das pessoas próximas em sua capacidade de lidar com a Filha das Trevas. Dani Moonstar e Cal Isaacs, os aliados de Magia na história, pouco são desenvolvidos e estão aqui justamente para servirem de degrau no desenvolvimento de Illyana. Apesar disso, ambos são abordados de maneira interessante e a falta de aprofundamento neles não é um defeito, mas uma questão natural de uma história com uma premissa focada em uma protagonista com tantas camadas.

Por tudo isso, este quadrinho não apenas prova o quão interessante a protagonista pode ser, mas também oferece ao leitor outras possibilidades para lidar com as próprias sombras internas. É possível aceitar a escuridão em você e mesmo assim praticar bons atos. É possível existir mesmo se sentindo quebrado e desajustado do mundo, mas também é preciso falar sobre a dificuldade desse caminho — e com sinceridade.


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O contraste entre as escolhas da heroína e as do antagonista perante o trauma é um dos pontos de destaque da obra. Por mais doloroso que seja um passado traumático, podemos avançar para o futuro praticando o bem. O sofrimento que ficou para trás não pode ser justificativa para que o presente do indivíduo seja marcado por mais dor a terceiros. Limiar, o vilão, é mais do que um antagonista: ele é um lembrete ao leitor do que podemos nos tornar ao trilharmos o caminho do ódio enquanto Illyana representa a alternativa positiva.

No fim das contas, a maior batalha deste enredo não é o confronto direto de Magia contra Limiar, mas a luta interna para ela continuar acreditando em si mesma. Ao fazer a mutante duvidar da própria força para conter a Filha das Trevas em si, o antagonista leva ao leitor um evento extremamente identificável para quem luta todos os dias para permanecer confiante em si, mesmo diante da “escuridão”. O lado “maligno” de Illyana é usado aqui como uma alegoria para as consequências de um trauma na vida de alguém, o que enriquece a experiência de leitura quando o público encontra em si algo semelhante.


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A vida de alguém traumatizado nos primeiros anos de sua existência jamais será fácil, mas ainda assim é possível encontrar um sentido positivo nela. Illyana escolheu ser uma agente do bem e salvar inocentes de destinos semelhantes ao seu como uma verdadeira heroína. A sua entrega, mas também os seus medos, é que fazem da aventura da X-Woman neste quadrinho algo tão conectável e atrativo.

Por fim, a arte é excelente e faz um excelente trabalho de transformar a leitura em algo visualmente interessante. Junto dela, o roteiro alcança um primoroso resultado, indo muito além de uma aventura genérica de super-heróis. A soma da arte e do roteiro criam uma excelente sugestão de ponto de partida para quem quer conhecer melhor a Magia. Ao mesmo tempo, a equipe criativa consegue mergulhar em assuntos densos que vão além do universo particular da personagem e transcende ao ponto da história ser atrativa para além dos interessados apenas na heroína.


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As cenas de luta são atrativas, embora nada nesse sentido se destaque de forma extraordinária aqui. Alguns podem enxergar isso como um defeito, visto que o aspecto combativo da personagem central é um elemento importante em sua essência. Em meu ponto de vista, as batalhas são boas, mas se tornam um aspecto mais apagado quando somos agraciados com o desenvolvimento primoroso do psicológico da protagonista. Ou seja: a ação não revoluciona, mas entrega o que promete enquanto assuntos mais sensíveis são o verdadeiro brilho dos primeiros cinco capítulos da nova revista da Magia.

A conclusão da narrativa no capítulo final toma uma decisão criativa, no que se refere à luta interna da heroína, surpreendente. Não é apenas uma mulher poderosa aniquilando monstros, mas uma sobrevivente que dá tudo de si por quem não tem forças para salvar a si mesmo. Ela não acerta sempre, mas faz o que pode. Essa jornada funciona também como um lembrete a todos que enfrentam diariamente a própria escuridão: “Acredite em si mesmo e não deixe que nenhum outro alguém defina quem você é, pois o seu futuro está em suas mãos ”. Nenhum de nós é apenas fruto dos nossos traumas. Sem dúvidas, recomendo!


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Roteiro: Ashley Allen

Arte: Germán Peralta

Lançamento: 2025

Nota: 5/5

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